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Afinal, o que é interdisciplinaridade?

Afinal, o que é interdisciplinaridade?

            Muito tem se falado sobre interdisciplinaridade nos últimos anos ou ainda nas últimas décadas. Sempre há alguém que defenda a importância de se aplicar esse conceito às práticas educacionais. As escolas,então, se mobilizam para promover eventos científicos cujo foco é a interdisciplinaridade. Os professores organizam projetos interdisciplinares e os alunos põem a mão na massa a fim de concretizá-los. Mas será que todos entendem de fato o que é interdisciplinaridade?

            O termo interdisciplinaridade, muitas vezes, parece ser usado como clichê descolado e inteligente quando se quer validar uma determinada proposta, metodologia ou prática pedagógica, mas no fundo nem todos sabem ao certo o que se quer dizer com isso ou o que de fato significa adotar uma perspectiva interdisciplinar para o ensino/aprendizagem.

A origem do conceito de interdisciplinaridade

            Não é difícil definir esse conceito. De modo geral, interdisciplinaridade é a “relação entre duas ou mais disciplinas ou ramos do conhecimento”ou ainda “a integração dos conteúdos de uma disciplina com outras áreas de conhecimento”.Mas de onde surgiu essa necessidade de “conectar disciplinas”, em que momento houve essa separação?

            Na Antiguidade, o universo era um cosmos e o ser humano encontrava-se inserido nessa ordem, relacionando-se com a natureza e a sociedade à sua volta. A princípio, tal unidade encontrava-se nos mitos. Conhecer o universo, portanto, era conhecer o próprio interior do ser humano. Ser um cidadão grego, por exemplo, compreendia ter o domínio de todas as artes, conhecer a natureza, a sociedade e a si mesmo, encontrando o equilíbrio gerador do bem-estar. Essa noção de formação integral do homem perdurou ainda na Idade Média, e não raro era compreendida a partir do conceito de Deus.

            A Ciência Moderna, no entanto, sobretudo pela influência de grandes pensadores como Galileu, Bacon, Descartes, Newton, Darwin e outros, passou a dividir o conhecimento em áreas, ramos e disciplinas, especializando-se. Buscava-se, a partir dessa perspectiva, a construção de uma concepção mais científica do mundo, levando a um olhar para as partes em detrimento do todo.

            Contudo, a excessiva fragmentação do conhecimento, levou a uma série de críticas à especialização, ainda em meados do século XVII, com o surgimento da Didática de Comenius (1592-1670), que registra a preocupação com a integração dos saberes.Foi somente na segunda metade do século XX, no entanto,que a interdisciplinaridade surgiu como alternativa diante da cisão dos saberes. Nasce assim um movimento contemporâneo que emerge na perspectiva da dialogicidade e da integração das ciências e do conhecimento, buscando romper com o fenômeno da hiperespecialização.

            No Brasil, o conceito de interdisciplinaridade passou a fazer parte do cenário educacional a partir da  Lei de Diretrizes e Bases (LDB) Nº 5.692/71 e mais fortemente com a nova LDB Nº 9.394/96 eos Parâmetros Curriculares Nacionais (1997), “influenciando o trabalho das escolas e dos professores para compreender o processo de ensino e aprendizagem como sistêmico e não como uma abordagem ou leitura estanque de conceitos e teorias”.

            Na Base Nacional Comum Curricular e Currículo (BNCC), no que diz respeito à implementação de currículos na Educação Básica, em consonância com a LDB  e as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN), reconhece que“a educação tem um compromisso com a formação e o desenvolvimento humano global, em suas dimensões intelectual, física, afetiva, social, ética, moral e simbólica” (BRASIL, 2017).Assim, o ensino básico tem como finalidade preparar os estudantes não apenas para o ensino superior, mas também formá-lo como pessoa apta a viver em sociedade. Isso acarreta certa responsabilidade por parte do educador, que, para atingir tais propósitos, não deve estar preso apenas à sua disciplina. Apresenta-se, portanto, a importância da interdisciplinaridade, que é a melhor maneira de desenvolver o pensamento crítico e formar o aluno para ter uma atitude mais ativa diante da vida.

Como trabalhar a interdisciplinaridade na escola?

            Embora as discussões sobre interdisciplinaridade datem de décadas atrás, e se manifestam em documentos oficias para a Educação Básica, ainda hoje há dificuldades em conceber o ensino a partir de uma perspectiva interdisciplinar, visto que isso exige a modificação de velhos hábitos e práticas, tanto por parte dos profissionais quanto dos próprios alunos.

            Nesse sentido, a escola, enquanto instituição legitimada de aprendizagem e produção de conhecimentos, precisa, cada vez mais, acompanhar as tendências da ciência contemporânea, adotando as exigências interdisciplinares que hoje participam da construção dos saberes escolares. Assim, a organização dos famigerados projetos político-pedagógicos, devem ter como desafio a superação do referencial dicotomizador e fragmentado do conhecimento que ainda orienta a prática de grande parte dos educadores.

            Em consonância com a BNCC, para superar uma perspectiva de ensino fragmentada, é necessário “decidir sobre formas de organização interdisciplinar dos componentes curriculares e fortalecer a competência pedagógica das equipes escolares para adotar estratégias mais dinâmicas, interativas e colaborativas em relação à gestão do ensino e da aprendizagem” (BRASIL, 2017). Para tal, gestores e professores podem seguir algumas dicas práticas, como:

  • Planejamento pedagógico eficaz, com a definição de eixos temáticos que entrelacem de maneira interativa diversas disciplinas;
  • Metodologias ativas, que coloquem os alunos no centro do processo de ensino-aprendizagem;
  • Flexibilizar a estrutura curricular, a fim de que os professores possam aplicar atividades interdisciplinares em sala de aula;
  • Aprendizagem baseada em projetos, que aposta na construção do conhecimento a partir de situação-problema;
  • Adoção de materiais didáticos com proposta interdisciplinar.

            Desse modo, um processo educativo desenvolvido na perspectiva interdisciplinar possibilita a relação entre teoria e prática e contribui para uma formação mais crítica, criativa e responsável dos alunos.Os professores, por sua vez, se estiverem totalmente familiarizados com o cotidiano interdisciplinar, até mesmo abordagens como a do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) – que cada vez mais adota um viés interdisciplinar – podem ser mais bem exploradas e resultar na formação integral e cidadã dos estudantes.

Saiba mais!

A interdisciplinaridade como um movimento articulador no processo ensino-aprendizagem

https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141324782008000300010&lng=pt&tlng=pt.

Revista Interdisciplinaridade

https://www.pucsp.br/gepi/downloads/revista_gepi_201011.pdf

Dayane Oliveira

Mestre em Linguística pela UFPB, graduada em Letras pela UFCG, é editora assistente da MVC Editora. Acredita no poder transformador da educação para a construção de um futuro cada vez melhor.