Em uma praça na zona oeste de São Paulo surge o convite: deixar as crianças livres para descobrirem o espaço e interferir o mínimo possível na experiência delas. Localizada entre a Vila Madalena e o Alto de Pinheiros, nas tardes de terça-feira, a Praça das Corujas ganha um significado educativo. O encontro integra a comunidade de aprendizagem Barro Molhado, um grupo que surgiu em 2013, a partir do desejo comum entre pais e educadores de refletirem sobre novas possibilidades de educação.
A princípio era uma reunião entre educadores e famílias que buscavam pensar em um processo de desenvolvimento infantil menos dirigido e mais autônomo. “Não é prioritariamente um caminho que precisa ser fora da escola, mas que traz uma ideia de que a família também acompanha o desenvolvimento das crianças e troca experiências com outros pais”, explica o educador Vicente de Góes, colaborador e participante da comunidade de aprendizagem desde o início.
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Chamado de Coruja Molhada, o encontro é aberto para todas as famílias interessadas e oferece a possiblidade das crianças se relacionarem de forma educativa com espaço público da praça. Enquanto algumas fazem desenhos e atividades manuais, um grupo se diverte subindo em uma árvore. Um menino passa pedalando em um triciclo de madeira, ao mesmo tempo, o outro brinca com a terra e descobre sons batendo com gravetos nas folhas secas que estão no chão. Todos aprendem e exploram o ambiente de acordo com suas motivações.
Nesse período, os adultos observam as interações e ficam atentos para escutar e oferecer às crianças o que elas precisam para prosseguirem nos seus desafios. “Tudo o que está aqui é material de brincadeira e propicia a criatividade, desde as árvores até a livre relação entre as crianças”, destaca a psicóloga e educadora Fernanda Giorgi Barsotti.
O encontro começa com Vicente tocando uma flauta e Fernanda o acompanha cantando. Logo, todos se reúnem em uma espécie de brincadeira musical, que menciona o nome de todos os presentes na roda. Após esse período de ambientação, o educador pede que as famílias “diminuam o seu volume de adulto” para deixarem as crianças descobrirem o espaço sem interferência ou imposições morais de o que é certo ou errado.
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Novas experiências educativas
O que se espera em uma experiência educativa não dirigida é que as crianças possam ser elas mesmas, agindo de acordo com os seus interesses natos. “Eu vejo que quando eles estão em um espaço onde são livres para fluir, eles se sentem à vontade”, comenta a gestora ambiental Renata Galvão, mãe de duas crianças que participam dos encontros na Praça das Corujas. “A cidade está cheia de espaços, mas a maioria deles são inóspitos para crianças”, afirma, ao mencionar sobre a importância de ter locais públicos onde as crianças podem interferir e participar.
Junto com os filhos, a empresária Danile Granato frequenta os encontros há dois meses. Ela define que o mais importante dessa experiência é a possiblidade das crianças estarem em contato com a natureza e explorarem esse ambiente como um todo. “Eles têm uma liberdade de não ter paredes e regras. Eles fazem da árvore o que eles querem. Vira balanço, vira escada, vira teatro”, conta.
De acordo com a empresária, a autonomia que as crianças encontram em uma educação não dirigida incentiva a quebra de obstáculos. “A confiança que eu tenho no meu filho faz com que ele tenha uma autoconfiança”, destaca.
Para a participante do grupo Marcela Peters, psicóloga e pesquisadora, além da convivência entre as crianças, o Barro Molhado possibilita muita troca entre os adultos, que compartilham ideias e questões da vida, como a maneira de educar os filhos. Segundo ela, uma das coisas que chamam atenção nessa comunidade de aprendizagem é a forma respeitosa como os adultos lidam com as crianças, permitindo que elas façam escolhas e tenham tempos diferentes. “Olhamos para os nossos filhos de uma forma diferente. Queremos construir uma educação que não seja apenas para o trabalho ou para formar verdades únicas. ”
Fonte: porvir.org